Durante toda a minha graduação em Letras, eu tive pânico de escola e de sala de aula. Minha experiência como aluna do ensino médio foi muito ruim. Simplesmente não conseguia me imaginar como professora. Na época da faculdade, eu já dava aulas particulares (de português, de francês e de redação) há um certo tempo, mas a gestão de turmas e de conteúdos não estava no meu horizonte profissional. Ao mesmo tempo, eu me apaixonava cada vez mais pela tradução e pela linguística do texto e do discurso. Em 2013, eu me formei e comecei a trabalhar como revisora de textos em uma empresa. Dois anos depois, em 2015, eu me mudava de empresa e vislumbrava um crescimento profissional significativo na área de revisão de textos. No entanto, em algum momento em 2016, eu passei a sentir um vazio profissional. Eu passava longas horas do meu dia imersa em textos e no silêncio. Sentia que faltava uma troca, uma vivência profissional que o texto não poderia me proporcionar. Sentia que faltava o Outro.
Foi em busca desse Outro e da busca do conhecimento compartilhada que me vi interessada, pela primeira vez, pela educação. Eu queria proporcionar a outras pessoas as mesmas trocas que tive com meus professores na faculdade. Eu sentia falta de trabalhar com a língua francesa e queria voltar a fazer isso em sala de aula, com meus próprios alunos. Essa busca se transformou em um sonho (me tornar professora de francês) e esse sonho atravessou momentos diferentes da minha vida pessoal e profissional quando, em 2018, recém-mudada para o estado de São Paulo e recém-aprovada no mestrado da USP, esse sonho começou a se transformar em realidade.
Eu não sei se vocês já passaram por isso, mas perseguir sonhos na vida profissional é um risco muito grande e parece a receita para um desastre. A primeira experiência que tive nesse sentido foi com meu intercâmbio acadêmico para a França. Em resumo, desde muito pequena, eu sonhava com esse momento. A realização desse sonho, entretanto, foi completamente diferente. Muito frustrante em vários aspectos. E muito gratificante em alguns outros. Foi difícil superar essa experiência, positiva e negativamente falando. Levei muito tempo para me recompor e para me reconectar com a língua francesa.
Sinto-me novamente do mesmo jeito em relação à docência. Ser professora é um sonho (mais recente e de menores proporções se comparado ao intercâmbio). Com o toque da realidade, esse sonho acabou me proporcionando momentos muito agradáveis e de partilha, exatamente como eu buscava. Tive o privilégio de ter alunos fantásticos desde o início. Sempre me lembro com muito carinho da minha primeira turma na Aliança Francesa de São Paulo. Aprendi com eles a ser professora na pandemia, a dar aulas on-line, a passar por todo aquele caos do início de 2020. Antes deles, eu estagiava na graduação em Letras da USP e aprendi, ao longo de todo o segundo semestre de 2019, a planejar e ministrar aulas para turmas de mais de vinte alunos. Essas duas primeiras experiências na docência me ensinaram que o mais importante para que a troca de conhecimento aconteça é de que haja um grande preparo pedagógico e de conteúdo de minha parte. A minha coordenadora da USP, na época, sempre dizia nas formações, quando alguém perguntava sobre o caso de os alunos não gostarem de nós, professores. Ela dizia, mais ou menos assim: "O importante é o conteúdo e como o ensinamos. Com gentileza, com carisma. Se fizermos bem o nosso trabalho, não importa se os alunos gostam da gente ou não. Não podemos controlar o que vão pensar da gente. Podemos fazer nossa parte da melhor forma possível. Nosso trabalho é esse: ensinar".
Em quase todos os lugares que trabalhei como professora, eu me baseei nesses princípios. Ainda acredito neles. Sempre busquei preparar minhas aulas do melhor jeito que pude. Ainda assim, existem imprevistos, e eles fazem parte da aula. Professor não é adivinha e não pode prever e se preparar para tudo. Afinal de contas, não sabemos exatamente o que os alunos irão nos perguntar. Nós podemos fazer algumas previsões com base no conteúdo ensinado, o que não nos assegura de cercar TODAS as questões possíveis em torno daquele tema. O que não sei responder, eu pesquiso e mostro ao aluno como procurar por si mesmo a resposta. Meu trabalho não se resume a dar resposta de exercícios: eu ensino a pensar e a pesquisar sobre a língua.
Apenas com uma única turma não consegui trabalhar dessa forma, simplesmente porque os alunos se recusaram em ter aulas comigo e não me permitiram me adaptar a eles. Foi muito frustrante para mim. Eu tinha crise de ansiedade a cada aula. Não conseguia dormir. Não conseguia me desligar desses problemas. Tive um burnout por causa disso e ainda sofro os efeitos dessa experiência. Eu não consegui criar com eles a troca que tanto buscava. Isso fez eu me sentir incapaz e inapta. Ainda me sinto assim.
É engraçado a força de uma única experiência negativa em nossas vidas, não é mesmo? Para que ela não se transforme em algo maior do que realmente é, sinto ser necessário o meu distanciamento da sala de aula, com o intuito de reavaliar a minha trajetória profissional. Nesse meio-tempo, aproveitarei para me aprofundar em outros saberes.
Eu me despeço da sala de aula. Serão minhas últimas semanas como professora responsável por turmas em escolas.
Agradeço a todos os alunos que se dispuseram a compartilhar o aprendizado da língua francesa comigo. Levarei vocês no coração ❤
Au revoir !
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