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Marcelo Corrêa Lima, tradutor juramentado de espanhol

A vida me presenteou ao proporcionar o contato com profissionais admiráveis. O entrevistado dessa semana é o tradutor juramentado Marcelo Corrêa Lima. Ele é a minha referência para traduções de espanhol e meu termômetro nas redes sociais para debates políticos. Esse cara tem muito a dizer sobre praticamente tudo e vale muitíssimo a pena conhecer um pouco mais sobre ele. Bora lá!





Marcelo, você possui licenciatura em Português pela Faculdade de Letras da UFMG. Como você se tornou tradutor juramentado de espanhol?

Concluí minha graduação em 2001, ministrando aulas em cursos pré-vestibulares e colégios, mas sempre trabalhando com tradução. Em 2009, fui aprovado em concurso promovido pela Junta Comercial do Estado de Minas Gerais (JUCEMG). Já fazia 13 anos que trabalhava como assistente da excelente tradutora juramentada Marilurdes Nunes, que me proporcionou o devido preparo para a prova da Junta Comercial.

Você também é mestre em Estudos Literários pela FALE/UFMG. Como você avalia a sua formação no trabalho que desenvolve hoje?

A formação literária amplia a visão diante de um texto técnico, que é seco, semanticamente falando. O trato com textos literários dentro (e fora) da pós-graduação possibilitaram maior facilidade na busca de novos significados quando se está fazendo uma tradução/versão. A leitura sempre amplia o campo de visão diante de qualquer texto.

Como é a rotina de trabalho de um tradutor juramentado?

O tradutor juramentado, por ser agente público, fica à mercê do mercado e suas demandas. Em 2012, por exemplo, realizava em média 6 traduções por dia para uma grande empresa têxtil da capital. Estas traduções eram laudos bilíngues emitidos na Espanha, em espanhol e inglês. Em 2013, a empresa espanhola decidiu expedir tais laudos em espanhol e português de Portugal. O resultado foi uma queda considerável em minha produção, que já estava afetada por questões diplomáticas com Espanha e Uruguai, pois ambos países não aceitam versões feitas no Brasil.
O contato do tradutor está disponível no site da JUCEMG, porém todo tradutor tenta aumentar sua visibilidade com anúncios ou lidando diretamente com empresas importadoras/exportadoras.
Em termos práticos, a rotina se resume a receber um documento, fazer o orçamento respectivo e aguardar a aprovação do cliente. Caso seja pessoa física, o pagamento é no ato da entrega. Se for pessoa jurídica, deve-se providenciar a Nota Fiscal respectiva, caso o tradutor tenha empresa para tal, ou ele assinará o RPA (Recibo de Pagamento a Autônomo) referente ao serviço.

E os materiais traduzidos? São de quais tipos?

Em tese, o tradutor juramentado está apto a traduzir qualquer tipo de documento, sejam estes pessoais, como carteiras de identidade, certidões de nascimento, casamento, atestados de óbito, passaportes, carteiras de motorista, etc., ou textos técnicos de qualquer área, como procurações, sentenças, cartas rogatórias, demonstrações financeiras, manuais, laudos, etc.
Está apto, inclusive, a traduzir textos manuscritos, desde que na tradução fique explicitado que se trata de “texto manuscrito” para não deixar margem de dúvida sobre sua origem.

Por trabalhar basicamente em casa, como você faz para separar trabalho de família? Dá para dividir o tempo entre eles?

Esta é, de fato, a parte mais difícil. Tenho um filho de 3 anos de idade, e conseguir ficar longe dele é algo quase impossível. A rotina da casa acaba interferindo muito na produção textual, que entrará madrugada adentro, dependendo do prazo de entrega.
No meu caso, o tempo para trabalhar começa quando meu filho está na escola e a esposa trabalhando.

E a sua relação com outros profissionais da área? Como é?

Graças a Deus, tenho ótimo relacionamento com meus colegas tradutores, juramentados ou não. Agir com transparência e com espírito de solidariedade é a melhor maneira de se conviver nesta profissão.
As indicações mútuas, caso a demanda seja em idioma diferente do seu, é uma forma de fixar-se no mercado, além de ajudar o colega. Além disto, temos encontros periódicos para manter e reforçar a relação interpessoal.

Como você avalia o mercado para tradução hoje? Na sua opinião, compensa mais trabalhar de que forma como tradutor?

O mercado para traduções é um pouco difícil. Há muitas agências que terceirizam este serviço contratando profissionais pouco qualificados, ou simplesmente estudantes e/ou pessoas que moraram no exterior, cobrando valores muito aquém da Tabela de Emolumentos especificada pela Junta Comercial. E infelizmente há profissionais que desonestamente contribuem com injustiças.
Já emiti orçamentos em que o cliente afirmou que uma agência aqui de Belo Horizonte cobraria 1/3 do que eu estava propondo.
Na minha opinião, o tradutor deve cadastrar-se no maior número possível de empresas privadas e órgãos públicos, mas também no Sintra (Sindicato Nacional dos Tradutores) e ABRATES (Associação Brasileira de Tradutores).

Como é o mercado editorial para tradutor juramentado?

Diria praticamente nulo. Por termos nossos preços regulados pela Junta Comercial respectiva, isto fará com que um orçamento para tradução/versão de qualquer tipo de livro sempre estará muito acima de um concorrente “livre”, por assim dizer.

Você também revisa em espanhol. Como é isso?

Sim. São casos mais raros, e ocorre geralmente para textos acadêmicos. Uso a cobrança por palavras e peço que os textos cheguem com prazo mais folgado para entrega, pois muita gente sempre quer tudo “pra ontem!”.

O que você diria para alguém que almeja ser tradutor juramentado?

Prepare-se bem. Leia e pesquise textos técnicos de áreas diversas, acostumando-se à forma e conteúdo destes textos. Além disto, leitura em outro idioma ajuda muito a flexibilizar o pensamento. Invista em bons glossários e dicionários.
E, claro, tenha boa sorte!

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